Dois Passos para o Discernimento Vocacional

Cristóvão O Silva


Para algumas pessoas a vocação que devem seguir, ou, para melhor dizer, a vocação que Deus lhes faz, parece ser para elas completamente clara, sem mistérios. Tais pessoas só conseguem imaginar-se fazendo uma só coisa na vida, e, a partir disso, correm atrás da realização plena de seu chamado vocacional. Todavia, as coisas não são assim tão fáceis para muitas pessoas que sofrem para discernir o chamado de Deus em suas vidas. A que estado de vida Deus me chama? Por que não o compreendo tão claramente?

Este estado de confusão é mais presente entre os jovens, evidentemente; mas pode acontecer com pessoas maduras também, quando surge na vida delas aquele momento que se pode chamar de “erupção da voz divina”. Veja-se, por exemplo, a história vocacional de um Santo Inácio de Loyola, que só veio a entender a sua vocação depois dos 40 anos de idade.

Para ajudar neste processo do discernimento vocacional, separamos duas dicas simples que podem trazer um pouco de luz aos corações confusos. Antes de os expor, porém, nunca é demais dizer que o processo de discernimento vocacional só faz sentido na vida cristã se a pessoa leva a sério aquele chamado fundamental e primeiro, o da santidade. Discernimento vocacional para corações inconversos é algo simplesmente inútil e ineficaz. Antes de tudo, escutemos o apelo de Nosso Senhor: “convertei-vos e crede no Evangelho” ( Mc 1, 15)

DESCUBRA QUAL É O LOCUS QUE FAZ VOCÊ FELIZ

“Locus” é uma palavra do Latim que significa “lugar”, “local”. Quando usamos uma palavra em Latim ou em qualquer outra língua, para representar uma realidade que também poderia ser expressa em nossa própria língua, queremos dizer, na verdade, além do significado habitual da palavra, que tal conceito é muito importante e precisa ser meditado com calma. O que é, então, o “Locus” da vocação?

O Locus da vocação é o lugar (físico) em que um estado de vida é exercido, bem como as atividades que lhe são inerentes; por exemplo, o Locus da vocação sacerdotal é a igreja (templo) e os trabalhos específicos são o oferecimento do Santo Sacrifício da Missa, ouvir confissões, o exercício dos demais sacramentos, o anúncio do Evangelho, dirigir a aconselhar espiritualmente os fiéis etc. Já o Locus da vocação matrimonial é o lar e os deveres da vida familiar, como a geração e a educação dos filhos, a dedicação mútua do casal, o trabalho etc.

Entendido bem o que é o Locus, o vocacionado deve imaginar-se desempenhando-o na vocação sobre a qual tem dúvidas. É possível também experimentar “algo” daquele Locus específico, como, por exemplo, participar de encontros vocacionais em seminários e conventos, a experiência no trabalho cotidiado etc. O vocacionado deve, então, analisar os sentimentos e emoções que lhe ocorrem nesta imaginação ou nestas experiências. Você se sente feliz e realizado nestas circunstâncias? É fácil ver-se desempenhando estes papéis? É fácil para você se ver vivendo neste Locus por toda a sua vida? Descubra qual é o Locus que faz você feliz.

VALORES E SIGNIFICADOS PROFUNDOS

Este segundo exercício de discernimento vocacional exige um pouco mais de reflexão. Enquanto que no exercício anterior você emprega a imaginação, neste aqui é preciso pôr a inteligência a trabalhar. Em que consiste?

Você deve entender que um estado de vida (matrimônio, sacerdócio, consagração religiosa etc ) não é uma frivolidade; é antes algo muito sério e grande. Para compreender sua grandeza e profundidade, duas coisas são necessárias. A primeira é aprender da Igreja qual é o seu significado; ler, por exemplo, o Catecismo, as meditações dos santos que escreveram sobre aquela realidade.

A segunda coisa a se fazer é meditar e sondar por nós mesmos, com os olhos penetrantes da fé, os significados profundos da vocação específica ao qual se sente chamado e sobre a qual se tem dúvidas. Esse entendimento profundo do estado de vida facilita o processo de escolha, pois ela põe diante dos nossos olhos aquilo que uma vocação é em essência. Essa compreensão vai gerar naturalmente a vontade de aderir ou não àquele estado de vida.

Acima de tudo, para discernir a vocação, é preciso abandonar-se em Deus pela oração; melhor ainda se este abandono se fizer pelas mãos de Nossa Senhora, pois a Virgem, como boa Mãe que é, aperfeiçoa o que em nós é imperfeito, e completa a nossa oração com a dela, dando-lhe uma eficácia mais poderosa. O discernimento vocacional, a escolha do estado de vida, não é um exercício sem fim a prolongar-se pela vida toda. Se Deus nos chama a algo, é razoável pensar que Ele, mais do que nós, está interessado em que lhe digamos sim; e se assim é, Ele há-de nos ajudar infalivelmente.